Foi uma surpresa boa tanto para os biólogos da UFRRJ como para a BRF. Afinal, fazia oito anos que não havia registro de opalescens no Estado do Rio. A empresa cercou o local, passando a fazer o seu monitoramento. E a futura fábrica de salsicha — a primeira da BRF no estado e ainda sem data de inauguração — está sendo construída num trecho do terreno que não incomoda os peixinhos.
— Temos um programa de bem-estar animal voltado para as espécie com que trabalhamos, que são aves e suínos. Mas sabemos que existem outras espécies que exigem o mesmo processo. A partir do momento em que encontramos os peixes no terreno de Seropédica, nossa posição foi de respeitar o espaço e fazer todo um trabalho para não impactar esse ambiente — afirma a veterinária Mariana Modesto, diretora de sustentabilidade da BRF.
Da família dos rivulídeos e encontrado apenas no Estado do Rio, o opalescens vive pouco. O professor Francisco Gerson Araújo, que coordena o Laboratório de Ecologia de Peixes da Rural, conta que o animal sobrevive em períodos de chuva. Quando a poça desaparece, ele morre. Mas deixa seus ovos enterrados, que ficam hibernando na seca. Com a volta da chuva, os ovos retomam o desenvolvimento e eclodem.
— Desde que os descobrimos, em novembro de 2019, eles aparecem e desaparecem — conta o professor. — Eu achava que não iria encontrar nada, mas encontrei. Foi por acaso. Antes, só tinha visto opalescens em museu. É difícil ver ao vivo. A poça seca, e ele morre.
Não há uma contagem do número de animais nem de poças localizados no terreno de Seropédica, já que uns desaparecem e outros surgem.
— Pegamos alguns poucos e levamos para o laboratório, para termos como testemunho de que o opalescens foi encontrado. Conseguimos preservar alguns, mortos e em bom estado, usando uma mistura com álcool e formol. A maior parte que encontramos, no entanto, devolvemos para a natureza — explica Araújo.
A descoberta foi publicada em dezembro do ano passado numa revista científica, a “Zoologia”, da Sociedade Brasileira de Zoologia. A publicação informa que o opalescens é uma 125 espécies de rivulídeos em extinção. A família tem 350 espécies.
Os biólogos da UFRRJ pesquisaram todo o terreno da BRF, que tem 600 metros por 500 metros. No trecho frontal, nada encontraram. As poças com os peixinhos estavam na parte de trás. Para garantir a preservação dos pequenos animais, o novo projeto da empresa precisou prever um recuo de cerca de cem metros lineares.
— Esse recuo não trará qualquer impacto de produção. Fizemos um remanejamento do layout para não atingir a área dos peixes, uma alteração do desenho. O local onde vive o opalescens não é de trânsito. Está isolado e cercado por telas — diz Mariana.
Até o achado, a diretora da BRF desconhecia a espécie. E, por enquanto, devido à pandemia do novo coronavírus, ela teve que se contentar em ver os peixinhos por fotos e vídeos:
— A gente é veterinária, mas aprende cada coisa nessa vida… Isso é que dá vontade de viver. Estamos bem felizes, e que bom que tivemos a parceria da Universidade Federal Rural do Rio para nos ajudar. Socialmente falando, só somos representativos para a comunidade, para o meio ambiente, quando conseguimos estabelecer boas parcerias
Araújo lembra que o opalescens não é comestível, e faz um alerta lembrando a importância de preservar a espécie:
— Um peixe como este pode comer um inseto, que pode ser o vetor de uma doença. Esse mosquito pode dar uma picada num homem. É o equilíbrio da natureza. Na hora em que você desequilibra a natureza, você vai ter alteração de saúde pública.
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